quarta-feira, 15 de maio de 2013

Sócrates e a sabedoria - Por Estevão Sousa


A Biografia de Sócrates

Sócrates nasceu em Atenas provavelmente no ano de 469 ou 470 A.C, ele era filho de Sofronisco, um escultor, e de Fenareta,  uma parteira.  Como cidadão ateniense, Sócrates recebeu uma educação dentro dos padrões de Atenas, ou seja, aprendeu música, ginastica, matemática, gramatica, etc. Em sua juventude Sócrates possivelmente exerceu a profissão paterna, tendo, posteriormente, participado como combatente na guerra de Peloponeso com bravura e grande capacidade física durante o combate militar.
Durante sua vida adulta, Sócrates levava uma vida simples, era casado com Xantipa e tinha três filhos, porém, a partir do momento em que se torna de fato um filósofo passa a ter discípulos, mais especificamente os mais jovens, e inimigos, as pessoas mais velhas e que se sentiam ameaçados com a “denuncia” que ele fazia. O fato de Sócrates ter virado uma personalidade em Atenas não significava que ele passou a ter uma vida luxuosa, pelo contrário, Sócrates andava pelas ruas de Atenas como uma espécie de mendigo e, devido a falta de tempo para exercer alguma atividade remunerada, Sócrates mal tinha recursos para subsistência.
Após ser amplamente perseguido, no ano de 399 a.C, Sócrates é acusado de corromper os jovens e introduzir outros deuses com suas teorias. Em sua defesa, Sócrates não se defende, mas diz-se injustiçado e clama para que seja penalizado pois não pretende desobedecer as leis da cidade de Atenas. O filósofo Ateniense não deixou nenhum escrito sobre suas teorias, pois ele acreditava que a filosofia deveria ser um modo de viver e não um sistema de ensinamento devidamente estruturado e registrado, contudo, seus discípulos se preocuparam em registrar sua filosofia, sobretudo Platão, que é tido como a referência mais fiel a filosofia de Sócrates.

Influências na filosofia de Sócrates

O pensamento de Sócrates representa um eixo na história da filosofia ocidental, ou seja, na história da filosofia existem filósofos “pré-socráticos” e filósofos “a partir de Sócrates”. Mas que característica faz com que a filosofia socrática seja considerada um eixo para a história da filosofia e quais foram as influências teóricas que levaram Sócrates a mudar os rumos da reflexão filosófica? Para entender essa ruptura que o filósofo instala no pensamento filosófico é preciso considerar três influências no pensamento de Sócrates: As concepções dos filósofos pré-socráticos, a cidade de Atenas (mais precisamente sua política) e, por fim, a influência dos Sofistas

1.       Os pré-socráticos

As teorias filosóficas anteriores a Sócrates procuravam buscar um princípio elementar que justificasse a existência das coisas da realidade que nos cerca, os teóricos desse período eram os chamados physiologos, ou seja, investigadores da natureza. O próprio termo “natureza” dentro dessa realidade dos filósofos pré-socráticos tem um sentido diferente do sentido que geralmente costumamos dar a essa palavra, para o grego a palavra “physys” compreende não só a natureza (reino vegetal, animal e mineral), mas, absolutamente toda a realidade que nos cerca, natureza para o grego é basicamente tudo o que existe tudo aquilo que “é”. Devido ao fato de que a natureza se comporta de maneira pouco uniforme e que cada homem tem uma impressão muito particular acerca da realidade, conclui-se a partir das teorias dos filósofos da natureza que não há como definir as coisas de uma maneira absoluta e final. Quando Sócrates inicia seu trabalho intelectual ele abandona o problema da origem das coisas na realidade e foca seu discurso filosófico no homem, mais precisamente, na alma do homem. Esse “trabalho filosófico” de investigação do intelecto humano nada mais é do que a missão que Sócrates deu a si mesmo: “Sair à procura daquilo que é o verdadeiro conhecimento”, porém, diferente dos filósofos da natureza, o filósofo ateniense deseja um conhecimento determinado, sem variações de impressão e estável.

2.       A cidade de Atenas

O momento em que Sócrates viveu foi marcado pela fase mais brilhante da civilização grega, o “século de Péricles”, a arquitetura da cidade de Atenas confundia-se com a paisagem natural, porém, o que fazia de Atenas o centro do mundo helênico era o fato de que a cidade era o maior centro econômico, politico, intelectual e cultural, onde viviam grandes pensadores de diversas áreas do saber que tinham sua estadia na cidade estimulada pelo próprio Péricles, ou seja, Atenas era uma cidade de “especialistas”. Nesse mesmo período era praticado em Atenas o primeiro regime democrático conhecido da história da humanidade. A democracia Ateniense era marcada pelas “Assembléias Populares”, onde os reconhecidos cidadãos tomavam importantes decisões sobre os rumos da cidade e também discutiam a criação de leis para a mesma. É por conta do regime democrático de Atenas que surge a preocupação com a formação do individuo, pois sem a educação específica e a técnica da oratória não seria possível ao cidadão decidir com virtude os rumos da cidade.  Sócrates, no entanto, parecia incomodar-se com as convicções que os gregos tinham a respeito de si mesmos, ele não acreditava que esta maneira de pensar fosse fazer a cidade progredir, pois o excesso de crença nos “especialistas” não abria margem para discussão e, consequentemente, não havia perspectiva de progresso ou avanço.

3.       Os sofistas

Dentro desta dinâmica de formação é que surge a figura do Sofista que, junto aos demais “especialistas” que viviam em Atenas, criavam determinados “padrões” para a educação e formação do cidadão. Os sofistas eram uma espécie de professores que ensinavam oratória e cobravam valores altíssimos pela prestação de seus serviços. O trabalho dos sofistas era muito valorizado e isso fazia com eles fossem disputados principalmente por políticos, comerciantes que se preocupavam em ter um bom desempenho nas assembleias e, assim, manter sua hegemonia econômica e social.
Os sofistas afirmavam uma posição totalmente contrária a filosofia pois acreditavam que não era possível ter o conhecimento “daquilo que é”, para eles, o mundo consistia nas opiniões que os homens eram capazes de produzir a respeito do mundo, mais precisamente da sociedade na qual estão inseridos. Assumindo essa postura com relação ao conhecimento os sofistas diziam que é necessário dominar a linguagem, pois através dela seria possível manipular as pessoas e as relações de modo que o bom orador sempre obtivesse benefícios com isso.
É evidente que Sócrates procurou conhecer a teoria dos sofistas assim como a dos pré-socráticos, porém, com relação aos sofistas Sócrates era ainda mais crítico. Segundo o filósofo ateniense os filósofos da natureza erraram por querer entender o que só os deuses podiam compreender já os sofistas, cometiam um desvio de caráter ao pretender usar joguetes de palavras para conseguir distorcer a realidade favorecendo interesses particulares.

A “Missão de Sócrates”

Ao contrário do que se possa imaginar a entrada de Sócrates na filosofia não se deu gradualmente após anos de estudo, ela foi “da noite do para o dia”. Segundo o texto “Apologia de Sócrates”, livro escrito por Platão, discípulo de Sócrates, nos trechos 20c à 24b, a origem dessa missão a qual Sócrates irá empenhar-se até sua morte deu-se a partir de uma revelação proferida pelo Oráculo de Delfos. Numa consulta ao oráculo, Querefonte, amigo de Sócrates, perguntou quem era o homem mais sábio da terra e a resposta foi que Sócrates era o homem mais sábio. Ao receber tal noticia, Sócrates fica intrigado imaginando o sentido dessa revelação e o peso que é ser, como declara o próprio deus, o homem mais sábio da terra. Apesar de ser um cidadão envolvido com a política de sua cidade preservar os costumes e tradições da religião grega, ele considerava-se uma pessoa comum com nenhuma habilidade ou capacidade especial que o destacasse no círculo social de Atenas, sua vida era humilde e privada de grades riquezas ou de ostentação intelectual.
A tentativa de interpretar a revelação do oráculo deixa Sócrates profundamente consternado, pois sua única certeza era a consciência de que não tinha conhecimento de nada. Após um profundo momento de reflexão Sócrates chega a conclusão de que se o oráculo de Delfos afirmou que ele era o homem mais sábio e ele tinha certeza de que não sabia de nada, então, todo suposto conhecimento que Sócrates julgava não possuir era infundado, contudo, embora o oráculo de Delfos não mentisse era necessário uma constatação daquela verdade, uma constatação “por si mesmo”, algo que pudesse ser “experimentado” ao invés de simplesmente “aceitado”, e é nesse momento que Sócrates resolve colocar em teste toda a dita sabedoria que poderia ser encontrada na cidade de Atenas com a finalidade de conferir a verdade do oráculo, começa então, a “missão de Sócrates”, que consistirá em investigar entre os “especialistas” de Atenas se sua sabedora é de fato real ou, se o oráculo tem razão e ninguém além do homem que reconhece que nada sabe, possui a verdadeira essência da sabedoria.
 É comum em qualquer sociedade democrática que o cidadão escolha aquele candidato que lhe pareça o mais apto para praticar justiça através do poder a da autoridade que lhe será conferida, contudo, será que apenas o julgamento particular de um cidadão é suficiente para saber se o candidato saberá agir com justiça na administração pública?  Será que falar bem é um indicio de sabedoria para o comando de uma sociedade? Os políticos de Atenas, assim como na maioria dos países em que se pratica a democracia atualmente, eram eleitos através de voto popular, e o povo ateniense levava a sério a decisão das assembleias, julgava-se que quando alguém fosse colocado no poder por conta das decisões das assembleias era por que esta pessoa realmente seria a mais sábia para governar. Sócrates resolveu testar o oráculo investigando se os políticos de Atenas não seriam homens mais sábios do que ele. Nas conversas com os políticos Sócrates pede que os políticos definissem princípios básicos da sabedoria de um político como, por exemplo, a justiça. As respostas dadas pelos políticos eram embaraçosas para eles mesmos e isso lhes gerava um grande constrangimento, pois mostravam inaptos para o trabalho político. Quando Sócrates percebe que os políticos não possuem sabedoria alguma imediatamente põe-se a alerta-los de que sua sabedoria na realidade é um grande engano e, sendo eles desprovidos de tal sabedoria, toda cidade estaria comprometida com suas decisões. O resultado dessa conversa com os políticos é uma coleção de inimigos. É interessante como a pratica de Sócrates nos faz refletir sobre a política, sobre como parece que o que Sócrates fez em Atenas não foi uma reflexão isolada. Em muitas sociedades as pessoas que ocupam cargos públicos nem sempre tem experiência para desempenhar suas funções e, quando isso acontece, o resultado é desastroso: dinheiro mal aplicado, empreendimentos mal planejados, custos desnecessários, corrupção, etc. Um político sem sabedoria é sempre danoso e o prejuízo é sempre, em ultima instância, estendido todos os cidadãos.
Outra figura analisada por Sócrates é o poeta. Um fator muito importante a ser destacado diz respeito ao fato de que os poetas eram, assim como as pitonisas do oráculo de Delfos, importantes personagens da religião grega, pois se acreditava que eles eram “inspirados” pelas musas do Olimpo a falarem sobre tudo o que há de mais belo, eles representavam nada menos do que um meio pelo qual os deuses mostravam aos homens não apenas suas histórias mas, sobretudo, seus próprios atributos e beleza divinos. É possível observar religião em absolutamente todas as civilizações e, ao falar em religião, imediatamente estamos falando sobre autoridades religiosas: sacerdotes, bispos, pagés, etc. A autoridade religiosa é uma autoridade por que se julga que eles estejam tão próximos do divino a ponto de reproduzir em nossa realidade tudo aquilo que é a “vontade” do divino. Porém é possível afirmar que uma pessoa que tenha contato com o que é divino é capaz de praticar aquilo do qual ela tem contato? Ora, se a autoridade religiosa é capaz de expressar o que há de mais sublime, então, ninguém tem tanta sabedoria sobre os elementos religiosos como beatitude, amor, virtude, etc.  Ao abordar o poeta, Sócrates admite que eles falavam de coisas muito belas, porém, sua suposta sabedoria não saía do plano da fala e da escrita. Não havia no “oficio” poético nenhum tipo de conhecimento real do que se estava falando, nada do que o poeta dizia era “sabido” por ele. Para entendermos melhor a colocação feita por Sócrates tomemos como exemplo o mais célebre poema do mundo grego, a Ilíada, nele encontramos a narrativa da guerra entre gregos e troianos movida pela paixão de Pares e Helena. Homero fala inspirado pelas musas sobre coisas bem curiosas como técnicas de construção naval, confecção de armamento, técnicas de guerra, porém, o próprio Homéro não era Engenheiro Naval, fabricante de espadas ou General de exército, ele era apenas um escritor, um poeta.  Quando Sócrates pede que os poetas falem sobre sua sabedoria de modo a especificar com detalhes as técnicas e até mesmo os sentimentos dos quais escrevem os poetas acabam por não saber falar ou fazer nada daquilo que escrevem e declamam e, mais uma vez Sócrates desconstrói as certezas de mais uma importante figura da sociedade ateniense arrumando para si mais uma porção de inimizades.
Como já vimos até aqui, Atenas assim como as grandes cidades era bastante setorizada, já falamos sobre políticos e artistas e vimos como Sócrates desconstrói a imagem que esses personagens criaram para si mesmo e provou até então que o oráculo estava correto. Contudo, ainda não mencionamos a classe mais numerosa da cidade de Atenas, a dos artesãos. Pensemos no artesão de Atenas como um trabalhador das cidades contemporâneas, ora, para ser trabalhador é necessário possuir o conhecimento técnico daquilo que se faz, por exemplo, para ser engenheiro é necessário conhecer a matemática, física de modo que tais conhecimentos se apliquem ao oficio do engenheiro a ponto de ele definir quais serão os materiais e as técnicas usadas para construir uma casa ou uma ponte sem que elas percam a sustentação e desabem. Do mesmo modo, para ser carpinteiro é necessário ter conhecimento técnico dos tipos de madeira adequados para se fazer objetos de modo que eles atendam a finalidade para o qual foram criados. Mas será que o Engenheiro ou o Carpinteiro conseguiriam administrar uma cidade tendo a sua disposição apenas o conhecimento das atividades que exercem? Em Atenas os artesãos eram o sapateiro, o carpinteiro, e até o médico, este ultimo porque seu conhecimento a respeito da saúde também era considerado uma técnica.  Sócrates admira o fato de o artesão possuir o domínio de uma técnica e fazer bom uso dela, contudo, ele verifica que com relação a outras instâncias da vida social o artesão é leigo e não tem consciência da deficiência que possui nestes demais setores da vida social. Imagine como é quando o sapateiro vai à assembleia popular para decidir os destinos da cidade, será que seu conhecimento em fabricar sapatos poderá ajudar-lhe a agir com justiça naquilo que será decidido na assembleia? Será que esse conhecimento em fabricar sapatos pode estender-se a outros saberes como, por exemplo, a medicina? É evidente que a resposta para ambas às perguntas será não, ou seja, por ter um conhecimento que é especifico e imaginar que a partir dele possa ter decisões em outras áreas, o artesão comete o mesmo erro que o poeta: fala sobre o que não sabe. Ao serem questionados sobre questões da vida em sociedade, os artesãos tomavam como ponto de vista o conhecimento que tinham e sempre relacionavam uma decisão certa com  aquilo que fosse mais próximo de suas próprias convicções. Ao ter seu conhecimento denunciado como particular e ingênuo, os artesãos também passaram a não gostar da presença de Sócrates na cidade de Atenas.
Sócrates foi o filho pródigo de Atenas, recusou aceitar sua soberba sem deixar de respeitar sua soberania. Com certeza o filósofo interrogou muitas pessoas agregando discípulo que, impressionados com sua capacidade de fazê-los enxergar sua condição de ignorância, passavam a segui-lo fielmente para ouvir seus ensinamentos e, inimigos que tinham sua ignorância trazida as claras e temiam perder seu status social. Contudo, o texto apologia de Sócrates nos faz pensar além das amizades ou inimizades que Sócrates possa ter conquistado, este texto escrito por Platão nos faz pensar a respeito daquilo que é a sabedoria. Sócrates empenhou-se em “ser sábio por si mesmo”, isso significa que ele não aceitou como “pronto” e “acabado” o conhecimento que havia em Atenas, ele decidiu investigar o conhecimento em sua ultima instância e acabou por provar que o conhecimento dos especialistas era infundado e isso apresentava um sério risco para a sociedade como um  todo. Além da questão política podemos ainda refletir sobre como Sócrates influenciou na filosofia e nas ciências de um  modo geral por inspirar um posicionamento que não admite “pontos finais”, ele criou um movimento constante a incessante em busca do conhecimento. Essa dinâmica da missão socrática retira do discurso filosófico as convicções e as certezas, e instala o culto a dúvida, ou seja, não são é mais a resposta de algo que interessa, mas a busca por esse algo. Quando se sabe sobre alguma coisa não é mais necessário procurar nada sobre ela, porém, quando a dúvida é a essência do saber a filosofia toma seu devido espaço e não aceita o “ponto final”, mas, engendra um processo dinâmico inacabável que não procura sempre mais do que aquilo que já possui. Aquilo que a missão de Sócrates trouxe para a humanidade foi muito mais do que livros na estante de filosofia, seu método, percorreu a história e iniciou não só uma nova concepção filosófica totalmente diferente da que vinha sendo praticada, mas também, um movimento intelectual que causará uma profunda influência na ciência nos diversos setores do saber humano.

Bibliografia:

Platão, 428 ou 7-348 ou 7 a.C
Defesa de Sócrates/ Platão. Seleção de textos de José Américo Motta; tradução de Jaime Bruna – Coleção Os Pensadores – 2.ed. – São Paulo: Abril Cultural, 1980.
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia:filosofia pagã antiga, v.1.  4ª ed. São Paulo: Paulus, 1997. 
Arendt, Hannah, A promessa da política/ Hannah Arendt; organização e introdução de Jerome Kohn; tradução Pedro Jorgensen Jr. – 3ªed. – Rio de Janeiro: DIFEL, 2010.
Imagens:
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cinemamegashow.com.br




Atividade:

1.       Como vimos, Sócrates foi o filósofo acusador da falsa sabedoria. Seus questionamentos sempre usavam a ironia como instrumento para desmascarar personagens ilustres e mostrar como não tinham a sabedoria que julgavam ter. Hoje não temos Sócrates para desmascarar alguns falsos sábios, contudo, instrumentos como a mídia, redes sociais, jornais, revistas etc, usam diversos artifícios para “ironizar” algumas figuras da sociedade, um desses instrumentos são as famosas “charges”, ou, simplesmente “tirinhas”. O método é simples, em uma estrutura de 3 à 6 quadros  o cartunista cria uma situação engraçada que, na maioria das vezes tem um cunho político ou social sendo retratado. Agora você terá que ser um “cartunista socrático” e criar uma situação em que Sócrates esteja dialogando com algum personagem histórico ou até mesmo do nosso tempo e fazer com que a “falta” de sabedoria do personagem escolhido seja evidenciada através da ironia Socrática.



A "Ética" de Espinosa - Por Iasmin Martins

Biografia

           Nesse trabalho falaremos sobre a “Ética” do filósofo Benedictus ou Baruch de Spinoza. Tal pensador nasceu em Amsterdã na Holanda em 24 de novembro de 1632 e morreu em 1677. Spinoza era de uma família tradicional judia portuguesa, seu pai era comerciante e bem sucedido. O filósofo gostava muito de estudar, primeiro estudou teologia, depois abandonou para estudar Física e também aprendeu Latim.
          Spinoza passava a maior parte do tempo sozinho e se comunicava por cartas com alguns amigos e pensadores, ele usava trajes simples. Ao estudar teologia, Benedictus começa a criticar alguns princípios religiosos e por conta dos seus escritos é excomungado pelos judeus em 1652. Antes ele já havia sido excomungado, mas os judeus ainda deram a ele uma chance de se redimir e pedir perdão pelos seus pensamentos, no entanto o filósofo recusou e foi excomungado pela terceira vez. Essa excomunhão se chamava Shammatha, e era uma excomunhão definitiva que o bania completamente das sinagogas e do judaísmo. Veremos a seguir um trecho do Anátema de excomunhão:

Com a sentença dos anjos e dos santos, com o consentimento do Deus bendito e com o consentimento de toda congregação, diante destes santos livros, nós expulsamos, amaldiçoamos, e esconjuramos Baruch de Spinoza, com os seiscentos e treze preceitos que estão escritos neles, com o anátema com que Josué excomungou Jericó, com a maldição com que Elias amaldiçoou os moços, e com todas as maldições que estão escritas na lei. Maldito seja ele de dia e maldito seja de noite, maldito em seu deitar, maldito seja em seu levantar, maldito seja em seu sair, e maldito ele em seu entrar.” (Anátema pronunciado contra Spinoza, em 27 de julho de 1656)

             Com a excomunhão ele foi proibido de se aproximar das pessoas a menos de 10 passos de distância e ninguém deveria se comunicar com ele, nem beber ou comer ou lavar-se na mesma água em que ele tomou banho. O que o tornou ainda mais solitário e também abandonado por sua família.
          Embora alguns intelectuais amigos de Spinoza o ajudassem financeiramente, Benedictus teve de aprender um ofício para se sustentar. Ele cortava e polia lentes ópticas e mais tarde passou a desenhar. Desse modo, ele podia se sustentar com um trabalho simples feito com as próprias mãos e terminar seus estudos. Não havendo mais nada que o prendesse em Amsterdã, ele partiu para casa de um conhecido na rota de Amsterdã a Auwerkerk. Mais ele se muda para Rynsburg, em seguida em Vooburg e depois em Haia.
           Spinoza sofria de tuberculose há muitos anos e tinha uma constituição muito frágil, e seu trabalho de polidor agravara suas péssimas condições respiratórias, devido ao pó do vidro das lentes que polia.  O pensador morre em Haia, em 21 de fevereiro de 1677, e foi enterrado dia 25 de fevereiro aos 44 anos de idade.
           As principais obras de Spinoza foram o Tratado teológico-político, Princípios da Filosofia de Descartes, Tratado da correção do intelecto, Reflexões metafísicas e a Ética, da qual falaremos agora.

Apresentação da Ética de Spinoza

        A Ética é uma obra póstuma, ou seja, foi publicada depois da morte de Spinoza, é escrita em Latim e é demonstrada segundo a ordem geométrica e dividida em cinco partes:
 I - Primeira parte - Deus
 II - Segunda parte - A Natureza e a Origem da Mente
 III - Terceira parte - A Origem e a Natureza dos Afetos
 IV - Quarta parte - A Servidão Humana ou A Força dos Afetos
 V - Quinta parte - A Potência do intelecto ou a Liberdade Humana
         A obra é dividida em definições, axiomas, proposições, demonstrações, escólios e corolários. Não podemos dizer que é um livro sobre a moral por se chamar Ética, alguns Spinozistas o encaram como uma forma de ver o mundo.
         Na parte I da Ética, os principais conceitos são: Deus sive natura, Substância, A ilusão do livre arbítrio e o preconceito finalista. Spinoza ficou conhecido por sua filosofia monista. Para tal autor Deus ou natureza eram nomes diferentes para a mesma coisa, e Deus era a substância primeira da qual todas as outras coisas existentes partem. A substância era sui generis, ou seja, aquilo que está na origem, ela não veio de alguma coisa, ela é causa em si mesma e só pode ser pensada por si mesma, e todas as outras coisas existentes são modos de expressão da substância, todos os outros seres têm uma coisa em comum, eles partiram de uma mesma substância. A Substância spinozista tem infinitos atributos. Os dois atributos que podemos conhecer são extensão e pensamento. A extensão seria o corpo ou matéria, e o pensamento seria o não-material, o conhecimento, a ideia, o processo. Uma cadeia rochosa, por exemplo, é formada por extensão e pensamento, os processos naturais que ela sofre são pensamento para Spinoza. Por isso o filósofo ficou conhecido por sua filosofia sem sujeito ou descentralizadora do sujeito. Para Spinoza o homem não era o centro de todas as coisas, mas assim como os outros modos da substância era formado também por extensão e pensamento, porém pensamento não era o mesmo concebido por Descartes (cogito), pensamento para Spinoza era todo o processo e fenômeno natural que ocorre no universo, independente de o homem conceber esses fenômenos. Tudo o que existe tem pensamento e está dado independente da existência do homem.
         Spinoza não faz a separação entre corpo e alma, como na filosofia dualista de Descartes, ele entende que o mundo mental e o físico coexistem numa mesma substância. Por isso sua filosofia ficou conhecida como panteísta ou monista. A única substância infinita é Deus e, apesar de denominar assim a substância, Spinoza não está falando do Deus judaico-cristão, pois não tem vontade ou finalidade, não é um ser que comanda todas as coisas lá do alto e que merece um culto ou uma prece.
         Para o holandês há certo determinismo na existência, todas as coisas acontecem por necessidade, por serem dadas do modo que devem ser e não de modo teleológico; até mesmo o comportamento humano é determinado, somos como marionetes e os eventos que ocorrem não dependem meramente da nossa escolha e da nossa vontade, pois as coisas se dão numa cadeia, numa rede de acontecimentos que não podemos controlar, e achar que podemos controlar e que somos livres para fazermos o que quisermos é o que Spinoza chama de ilusão do livre-arbítrio, além disso, achar que as coisas foram feitas para nós e que podemos usá-las como bem entendemos é o que ele chama de preconceito finalista. São esses os principais conceitos da Ética I que trataremos neste trabalho.

Trecho do texto de Spinoza
Apêndice da Ética I
Ética/Spinoza; tradução de Tomaz Tadeu, Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.

         “Ora, todos os preconceitos que aqui me proponho a expor dependem de um único, a saber, que os homens pressupõem, em geral, que todas as coisas naturais agem, tal como eles próprios, em função de um fim, chegando até mesmo a dar como assentado que o próprio Deus dirige todas as coisas tendo em vista algum fim preciso, pois dizem que Deus fez todas as coisas em função do homem, e fez o homem, por sua vez, para que este lhe prestasse culto. É esse preconceito, portanto, que, antes de mais nada, considerarei, procurando saber, em primeiro lugar, por que a maioria dos homens se conforma a esse preconceito e por que estão todos assim tão naturalmente propensos a abraçá-lo. Mostrarei, depois, sua falsidade e, finalmente, como dele se originaram os preconceitos sobre o bem e o mal, o mérito e o pecado, o louvor e a desaprovação, a ordenação e a confusão, a beleza e a feiura, e outros do mesmo gênero. Não é este, entretanto, o lugar para deduzi-los da natureza da mente humana. Será suficiente aqui que eu tome como fundamento aquilo que deve ser reconhecido por todos, a saber, que todos os homens nascem ignorantes das causas das coisas e que todos tendem a buscar o que lhes é útil, estando conscientes disso. Com efeito, disso se segue, em primeiro lugar, que, por estarem conscientes de suas volições e de deus apetites, os homens se creem livres, mas nem em sonho pensam nas causas que os dispõem a ter essas vontades e apetites, porque as ignoram. Segue-se, em segundo lugar, que os homens agem, em tudo, em função de um fim, quer dizer, em função da coisa útil que apetecem. É por isso que, quanto às coisas acabadas, eles buscam, sempre, saber apenas as causas finais, satisfazendo-se, por não terem qualquer outro motivo para duvidar, em saber delas por ouvir dizer. Se, entretanto, não puderem saber dessas causas por ouvirem de outrem, só lhes resta o recurso de se voltarem para si mesmo e refletirem sobre os fins que habitualmente os determinam a fazer coisas similares e, assim, necessariamente, acabam por julgar a inclinação alheia pela sua própria. Como, além disso, encontram, tanto em si mesmos, quanto fora de si, não poucos meios que lhes é útil, como, por exemplo, os olhos para ver, os dentes para mastigar, os vegetais e os animais para alimentar-se, o sol para iluminar, o mar para fornecer-lhes peixe, etc., eles são, assim, levados a considerar todas as coisas naturais como se fossem meios para sua própria utilidade. E, por saberem que simplesmente encontraram esses meios e que não foram eles que assim os dispuseram, encontraram razão para crer que deve existir alguém que dispôs esses meios para que eles os utilizassem.”



Interpretação do texto de Spinoza

            Esse preconceito, do qual todos os outros derivam, é o preconceito finalista, ou seja, é o preconceito que os homens têm ao achar que todas as coisas da natureza agem em função de um fim. Visto que os homens são ignorantes, ao tentar explicar as coisas, eles explicam da forma que é melhor para eles, ou seja, da forma que lhes convêm e tendem sempre a buscar o que lhes é útil.
            Segundo Spinoza (2005), ao encontrar tantas coisas na natureza, o homem pensa que pode usufruir delas, pois ele não entende que cada uma tem sua própria causa para existir, cada uma tem seu valor independente do homem; logo, o homem tende a ver as coisas como se tivessem sido feitas para o seu próprio uso. E os homens fazem isso com base no argumento de que existe um Deus gerador que criou todas as coisas da natureza em função deles. Assim, criaram inúmeras formas de cultuar os deuses para que esses continuassem, por assim dizer, a satisfazer os seus desejos.
            O preconceito finalista virou superstição e cada vez mais os homens tentaram explicar a finalidade das coisas baseados em suas teses sobre um Deus gerador, e logo acharam um meio preconceituoso de explicar as coisas desagradáveis que ocorrem na natureza, como terremotos e doenças. Eles disseram que esses eventos naturais aconteciam por causa da ira dos deuses diante das faltas cometidas pelos homens.  Ao invés dos homens perceberem que esses eventos ocorreriam de qualquer modo, pois estão previstos pela natureza e fazem parte dela, eles preferiram continuar ignorantes e explicaram tudo baseados na tese da vontade divina. Deleuze deixa bem clara a crítica que Spinosa faz ao preconceito finalista:

A crítica de Spinoza possui dois pontos culminantes: não há nada de possível na natureza, isto é, as essências de modo não existentes não são modelos ou possiblidades em um entendimento divino legislador: não há nada de contingente na Natureza, a saber, as existências não são produzidas pelo ato de uma vontade divina que, à maneira de um príncipe, poderia ter escolhido outro mundo e outras leis.” (Deleuze, 2002: 95)  

             Para Spinoza (2005:43), essas superstições de que existe um Deus legislador afastam os homens do conhecimento verdadeiro das coisas. Só razões como as da matemática, as quais não se ocupam dos fins das coisas, mas das essências e propriedades dos objetos, é que poderiam levar os homens ao conhecimento verdadeiro e afastá-los desses preconceitos, que fazem permanecerem ignorantes os homens.
             De acordo com esse preconceito finalista, o homem acredita que vive de forma livre, pois Deus fez todas as coisas para ele usufruir como bem entender. Só que o agir do homem é condicionado à finalidade, ou seja, o homem é movido cegamente pelas suas vontades, ele é movido como uma marionete e crê que age livremente. Ele faz isso porque ignora as forças que o impelem. Para Spinoza, Deus é natureza, substância única e causa de si, e os homens estão submetidos às leis da natureza e a vontade está submetida às leis da natureza assim como todos os outros fenômenos. Para tudo há uma causa e esta causa encontra-se na natureza, não em um Deus criador.
            Sendo assim, os homens não têm poder sobre suas escolhas, eles não são autores dos seus desejos, apenas seguem uma série de determinações causais sem conhecê-las totalmente. Com isso, Espinosa conclui que o livre-arbítrio não passa de uma ilusão, não passa de imaginação humana e o que a doutrina finalista faz é inverter a natureza, considerando como efeito o que é causa e vice-versa.
            Segundo Spinoza (2005), os homens tentaram explicar a natureza, mas eles apenas imaginaram como as coisas estavam dadas na natureza e, confundindo intelecto com imaginação, fizeram algumas divisões denominando as coisas de perfeitas ou imperfeitas, de acordo com o modo pelo qual eram afetados por elas. Assim, quando um cheiro desagradava ao olfato, era chamado de malcheiroso; se agradasse, era chamado de perfumado etc. Dessa forma, os homens estabeleceram os contrários por meio de exclusão: se fosse agradável, era perfumado e se não fosse, malcheiroso.
            Os homens só fizeram isso porque permaneceram na ignorância, achando que todas as coisas tinham sido feitas para eles e, se não os agradasse, só podiam ser imperfeitas. Como fica claro na filosofia de Spinoza, as leis da natureza só produziram coisas extraordinárias, e a perfeição das coisas só deve ser avaliada pela sua natureza e potência, ou seja, não são os homens que determinam a perfeição ou imperfeição das coisas que existem na natureza, até porque elas não foram criadas para eles.
           
                                    Questões e questionamentos sobre o texto

1-      Por que a substância Spinozista difere da substância cartesiana?
2-      O que podemos entender com o conceito “Deus sive natura
3-      Defina de maneira resumida e com as palavras do texto o que Spinoza chama de preconceito finalista.
4-      O conceito de substância é esclarecido em qual livro da Ética spinozista?
5-      Em quantas partes está dividida a Ética de Spinoza?
6-      Por quais motivos o filósofo foi excomungado pelos judeus?
7-      O Deus de Spinoza é o mesmo Deus judaico-cristão?
8-      O que podemos aprender com a filosofia Spinozista descentralizadora do sujeito?
9-       Por que dizemos que a Ética é demonstrada ao modo dos geômetras?

Proposta de atividade

        Como atividade, estamos propondo um jogo com as proposições da Ética I de Spinoza para que o aluno possa relacionar as proposições com as definições. Dois ou mais alunos disputariam o jogo.
     As proposições e as definições já estariam dadas em uma espécie de quadro ou tabuleiro e o aluno devera interliga-las. Ele deve fazer isso ligando a definição que ele acha que mais se parece com a proposição que foi dada. Venceria o jogo o aluno que mais acertasse a relação entre as proposições e definições spinozistas. Desse modo, os alunos iriam se divertir e interagir aprendendo conceitos de uma das principais obras filosóficas da modernidade e fariam a leitura da obra do modo geométrico como o autor propôs.
Exemplo: Proposição 1. Uma substância é, por natureza, primeira, relativamente às suas afecções= Definições 1 e 3.
 Definição 1- Por causa de si compreendo aquilo cuja essência envolve a existência, ou seja, aquilo cuja natureza não pode ser concebida senão como existente.
Definição 3- Por substância compreendo aquilo que existe em si mesmo e que por si mesmo é concebido, isto é, aquilo cujo conceito não exige o conceito de outra coisa do qual deva ser formado.

Sugestão de atividades

          Visitar o site francês Spider Spinoza e ir clicando nos conceitos da Ética para que se forme o emaranhado e a conexão entre esses conceitos, a fim de melhor entender a divisão geométrica da obra de Spinoza e os seus conceitos chaves.
           Visitar o site da revista Conatus, que foi feito para divulgar os trabalhos dos pesquisadores e estudiosos da obra de Benedictus de Spinoza.



  Referências Bibliográficas
SPINOZA, Benedictus de. Ética. Tradução de Tomaz Tadeu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.
DELEUZE, Gilles. Espinosa Filosofia prática. Tradução de Daniel Lins e Fabien Pascal Lins. São Paulo: Escuta Editora, 2002.






Schopenhauer: Vontade e Representação - Por Isis Tomás da Silva

Vida e Obra

Schopenhauer, conhecido como o filosofo do pessimismo, nasceu em Dantzig, no dia 22 de fevereiro de 1788. Em 1793, com a anexação de Dantzig à Polônia, sua família mudou-se para Hamburgo, onde em 1805 seu pai veio a cometer suicídio.
Com a morte do patriarca da família, Schopenhauer e sua mãe mudaram-se para Weimar, porém o convívio entre os dois  era insustentável, piorando ainda mais quando Goethe, um escritor e amigo da família veio a dizer  a madame Schopenhauer que o filho se tornaria um homem muito famoso, acarretando uma briga mais séria onde sua mãe veio a empurra-lo escada abaixo, sendo que diante daquilo Schopenhauer cheio de amargor informou-a que a posteridade a conheceria somente através dele.
Schopenhauer deixou Weimar pouco depois e apesar de sua mãe ter vivido mais vinte e quatro anos, ele nunca mais a viu.
Enquanto isso, Schopenhauer passara pelo ginásio e pela universidade e aprendera mais do que o oferecido pelos currículos. Saiu de lá com uma infecção venérea que afetou seu caráter e sua filosofia. Tornou-se sombrio, cínico e desconfiado, era obcecado por temores e visões sinistras, mantinha os cachimbos trancados a cadeado, nunca entregou o pescoço à navalha de um barbeiro, dormia com pistolas carregadas ao lado da cama e não suportava barulho, ele escreve que a quantidade de ruído que alguém pode suportar sem se perturbar está na proporção inversa de sua capacidade mental e intelectual.
            Ele possuía um sentido quase que paranóico de grandeza não reconhecida, não alcançando a fama e o sucesso, voltou-se para dentro de si mesmo e roia sua própria alma.
Não tinha mãe, nem esposa, nem filhos, nem país. “Estava inteiramente sozinho, sem um único amigo.”
Já em 1813 ficou tão dominado pela influência do entusiasmo de Fichte por uma guerra de liberação contra Napoleão, mas ao invés  de partir para a guerra foi para o campo e escreveu uma tese de doutorado de Filosofia.
Após essa dissertação sobre A quádrupla razão do princípio de razão suficiente (1813),
Schopenhauer dedicou todo seu tempo e devotou todas suas forças ao livro que seria sua obra-prima — O Mundo Como Vontade e Representação. Enviou o manuscrito ao editor com os maiores elogios, ali, dizia ele, não estava uma simples reformulação de idéias velhas, mas sim uma altamente coerente estrutura de pensamento original, "claramente inteligível, vigorosa e não sem beleza"; um livro "que dali em diante seria a fonte e motivo para uma centena de outros livros”. Muitos anos depois Schopenhauer estava tão certo de ter dado solução aos problemas principais da Filosofia que pensou em mandar cinzelar em seu anel de sinete uma imagem da Esfinge atirando-se ao abismo como prometera fazer quando seus enigmas fossem solucionados. No entanto, o livro quase não atraiu atenção; o mundo estava pobre e exausto demais para ler o que se dizia sobre sua pobreza e exaustão. Dezesseis anos após sua publicação, Schopenhauer foi informado de que a maior parte da edição fora vendida como papel velho. Schopenhauer colocou-se tão completamente neste livro que suas obras posteriores não são senão comentários do mesmo; Em 1836 publicou um ensaio, Da Vontade na Natureza, que até certo ponto foi incorporado à edição aumentada de O Mundo Como Vontade e Representação que surgiu em 1844.
Em 1841 veio o trabalho Os Dois Problemas Básicos da Ética e em 1851 apareceram dois substanciais volumes Parerga et Paralipomena — literalmente "Acessórios e Remanescentes" .Por esse último, que é a sua obra de mais fácil leitura e que é repleta de sabedoria e espírito, Schopenhauer recebeu, como remuneração total, dez exemplares grátis.
Ele tinha a esperança de ter uma oportunidade de apresentar sua filosofia em uma das grandes universidades da Alemanha, essa oportunidade apareceu em 1822, quando foi convidado a ir para Berlim como docente (privat-docent).
Ele de propósito escolheu para suas conferências as horas exatas em que o então Hegel dava suas aulas. Schopenhauer confiava em que os estudantes encarariam a ele e a Hegel com os olhos da posteridade. Mas os estudantes não podiam se antecipar tanto e Schopenhauer viu-se falando diante de cadeiras vazias.
Em 1831 espalhou-se em Berlim uma epidemia de cólera com isso schopenhauer fugiu para  Frankfurt, onde passou o restante de seus setenta e dois anos.


Apresentação do Mundo como vontade e como representação:

O mundo como vontade e como representação encontra-se dividido em quatro livros.
No Livro I, Shopenhauer trabalha com as questões da teoria do conhecimento, para tal, apresenta um primeiro ponto de vista: a representação submetida ao princípio da razão suficiente (tempo, espaço, causalidade. No Livro II, o mundo, para ele, é tomado como vontade. Neste livro, investiga-se a objetivação da vontade por meio da construção de uma metafísica da natureza. No Livro III, o mundo é retomado como representação, mas agora sob um "segundo ponto de vista" independente do princípio de razão ( tempo, espaço, causalidade), trata-se da idéia platônica, do objeto da arte, por meio da construção de uma metafísica do belo.
no Livro IV, o mundo é retomado como vontade, também a partir de um "segundo ponto de vista" que abandona o "princípio de razão". Nesse livro, investiga-se a prática de vida por meio da construção de uma metafísica da ética.

Trecho do texto de Schopenhauer

O mundo é a minha representação – Esta proposição é uma verdade para todo o ser vivo e pensante, embora só no homem chegue a transformar-se em conhecimento abstrato e refletido. A partir do momento em que é capaz de levá-lo a este estado, pode dizer-se que nasceu nele o espírito filosófico. Possui então a inteira certeza de não conhecer nem um sol nem uma terra, mas apenas olhos que vêem este sol, mãos que tocam esta terra; em uma palavra, ele sabe que o mundo que o cerca existe apenas como representação, na sua relação com um ser que percebe, que é o próprio homem. Se existe uma verdade que se possa afirmar a priori é esta, pois ela exprime o modo de toda a experiência possível e imaginável, conceito muito mais  geral que os de tempo, espaço e causalidade que o implicam. Com efeito, cada um destes conceitos, nos quais reconhecemos formas diversas do principio da razão, apenas é aplicável a uma ordem determinada de representações; a distinção entre sujeito e objeto é, pelo contrário, o modo comum a todas, o único sob o qual se pode conceber uma representação qualquer, abstrata ou intuitiva, racional ou empírica. Nenhuma verdade é portanto mais certa, mais absoluta, mais evidente do que esta: tudo o que existe, existe para o pensamento, isto é, o universo inteiro apenas é objeto em relação a um sujeito, percepção apenas, em relação a um espírito que percebe. Em uma palavra, é pura representação. Esta lei aplica-se naturalmente a todo o presente, a todo o passado e a todo o futuro, àquilo que está longe, tal como aquilo que está perto de nós, visto que ela é verdadeira para o próprio tempo e o próprio espaço, graças aos quais as representações particulares se distinguem  uma das outras. Tudo que o mundo encerra ou pode encerrar está nessa dependência necessária perante o sujeito, e apenas existe para o sujeito. O mundo é portanto representação.”






Interpretação do texto de Schopenhauer

Tudo o que pensamos é uma representação do mundo, mas qual o significado íntimo de tais representações, qual a essência de tudo que vemos?
O mundo segundo Schopenhauer está dividido em duas esferas, tal qual uma é a representação e a outra a vontade, o mundo como representação está ligado ao mundo como vontade,  essa vontade seria um tipo de sentimento, uma essência do mundo existente em todos os seres, independentemente de serem eles possuidores ou não das faculdades cognitivas, esse mundo representativo é o mundo visível e submetido ao espaço,  ao tempo e a causalidade é um outro ponto de vista para o mundo como vontade, contudo,  são dois pontos de vista, duas perspectivas distintas de acesso ao mesmo mundo, absolutamente imanente. Já a representação, neste caso, se daria através da forma como um sujeito percebe o mundo, ela seria a expressão racional da vontade, de modo que a existência desse mundo seria inadmissível sem que houvesse esse sujeito que o percebesse, assim sendo, tudo o que existe, existe apenas para o sujeito, nosso próprio corpo enquanto percebido por outros sujeitos, passa a ser objeto, e dele se abstrai uma representação. Essa estrutura da representação é universal - visto que as condições que nos permitem representar estão presentes no cérebro. O que pode ser individual são os conteúdos intuitivos, bem como nossa reação volitiva as tais representações, pois nosso caráter é individual e único.
   Segundo Schopenhauer, em vez de a razão puramente definir o homem e "apresentar todas as respostas do mundo", são o corpo e a vontade que permitem alcançar e dizer o sentido das coisas, isso se daria porque, para ele, a obtenção do conhecimento iria além da razão, principalmente por ter valorizado um componente novo nas discussões filosóficas: a noção de corpo, ou seja, o sentido das coisas se daria por meio das possibilidades volitivas de cada agente. Com isso ele acredita que a base da formação do nosso conhecimento racional não é racional, já que começa com as sensações corporais. Assim, em vez da racionalidade, agir de forma independente e única, ela torna dependente dos dados corporais.
Portanto, há dois pontos de vista para observar o mundo, sendo as duas perspectivas do sujeito, uma seria representativa e intelectiva, e a outra a partir da vontade.  
Por fim, cada ser humano tem sentimento próprio, não existe sentimento ou saber abstrato que sirva de base para todos os outros sentimentos. Porem existe dois tipos de representação as abstratas e as intuitivas, as abstratas são relacionadas à razão, são concepções, é o que é extraído da experiência do concreto para ser transformado em conceito. Já as representações intuitivas são aquelas que ocorrem no entendimento, as intelecções, ou seja, antes de demonstrar a essência de algo é necessário sentir, logo, há prioridade do intuitivo sobre o abstrato. O papel da representação nessa relação é que ela transporta a vida para o conceito, por ela é que as representações passam de intuitivas para abstratas.






1. Segundo a concepção de representação para Schopenhauer, seria possível duas pessoas distintas enxergar o mundo de uma mesma maneira? Por que?

2.
Qual a relação entre sentir e pensar para Schopenhauer?

3. Por que  a obtenção do conhecimento iria além da razão?



Proposta de atividade

A atividade que será proposta a seguir tem como objetivo expor diferentes percepções a partir de um mesmo objeto como verificado no conceito de representações em Schopenhauer.

  1. Observar a imagem apresentada;
  2. Destacar e justificar o que mais lhe chamou a atenção;
Debater com a turma, de acordo com o que foi lido, como se deu o processo de  percepção.


Dica de filme


 A vida é bela (La vita é bella de Roberto Benigni, 1998)

Nesta obra pode ser analisadas as idéias de otimismo, ilusão e representação para o querer-viver perpassadas pelo filme à luz da idéia de Schopenhauer sobre a Vontade como a verdadeira essência do mundo.


Bibliografia:
SCHOPENHAUER, Arthur. As dores do mundo.

Chevitarese, L, Capítulo 1: O "pensamento único" da Metafísica da
Vontade: as questões da ética e da liberdade.

SCHOPENHAUER, Arthur. O Mundo Como Vontade e Representação. Rio de Janeiro: Contraponto, 2001


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